O 25 de novembro, Dia Internacional de Combate à Violência Contra as Mulheres, é uma data que reforça a necessidade de chamar a atenção para esse mal: a violência de gênero. É urgente exigir investimentos e políticas públicas dos governos contra tão alarmantes estatísticas.

A 14ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgada em outubro último foi apresentada sob o contexto da pandemia da covid-19 e reafirma a crescente violência de gênero. Homicídios dolosos de mulheres (quando há a intenção de matar) e feminicídios (assassinatos que envolvem questão de gênero e violência doméstica) cresceram no primeiro semestre de 2020 em comparação com o mesmo período de 2019. Ou seja, cresceram durante a pandemia, quando muitas mulheres, além da violência sofrida, não saíram de casa para não se expor ao vírus.

Os homicídios dolosos contra mulheres aumentaram de 1.834 para 1.861, um acréscimo de 1,5%. Também cresceu o número de vítimas de feminicídio: de 636 para 648, um aumento de 1,9%. Mas de 2016 a 2019, os casos de feminicídio aumentaram em 43%. É lastimável!

Além disso, matéria publicada por Universa (Uol), baseada no anuário, aponta o aumento do número de um estupro a cada 11 minutos em 2015 para um a cada 8 minutos em 2019. No ano passado foram registrados 66.123 boletins de ocorrência de estupro e estupro de vulnerável, sendo que cerca de 85,7% das vítimas são mulheres.

O registro de ocorrência de violência doméstica cresceu em 5,2%. Durante todo o ano de 2019, foi registrada uma agressão física a cada dois minutos: um total de 266.310 aponta Universa a partir dos dados da pesquisa que foram compilados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, baseados em informações das Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social dos estados.

Houve uma queda indicada no número total de estupros, de 66.907 para 66.123 ainda entre os anos de 2018 e 2019. Entretanto, os pesquisadores indicam os casos de subnotificação, em que as vítimas não procuram as autoridades seja por medo, sentimento de culpa e vergonha ou até mesmo por desestímulo por parte das autoridades.

Um exemplo expressivo de justiça machista e burguesa existente no país se deu no julgamento em Santa Catarina do empresário André de Camargo, acusado de estupro Mari Ferrer, mas absolvido pela justiça em setembro desde ano. Além de absolver o estuprador, a sentença revoltou pela humilhação e exposição a que a mulher foi submetida, diante de uma corte masculina, que garantiu a impunidade do empresário.

A indignação com o caso levou manifestantes às ruas, mesmo com a pandemia, para denunciar a cultura do estupro no país, que naturaliza a violência sexual sofrida por mulheres e, pior, a culpam, como aconteceu com a jovem de Santa Catarina, sendo esse um dos motivos da subnotificação dos casos.

De acordo com Mariah Madeira, do movimento Rebeldia, ligado à CSP-Conlutas e um dos movimentos que convocou protestos em Santa Catarina, essa sentença é indignante, porque demonstra a verdadeira face da justiça. “É burguesa, tem classe, tem um lado, tem raça, gênero, tem sexualidade. Isso indigna tanto, porque assistimos a juventude negra encarcerada em massa todos os dias sem nenhum julgamento prévio e ao mesmo tempo assistimos ao julgamento de um homem branco e rico, poderoso, que tinha todas as provas nas costas para sua punição e foi inocentado com o argumento de falta de provas. Para Mariah, no capitalismo que é rico, poderoso, é quase inatingível. “Se a Mari Ferrer que conseguiu pagar um advogado, não conseguiu justiça, como fica a situação das mulheres pobres?, questiona. A militante acredita que a justiça não será feita pelas mãos dessa justiça burguesa.

A violência contra a mulher negra

A cada 10 pessoas mortas por policiais nas periferias do Brasil, oito são negras.

As mulheres negras também são as maiores vítimas neste contexto, de acordo com o Anuário. Dos assassinatos cometidos por violência doméstica ou discriminação de gênero 66,6% tinham essa cor de pele.

Ainda de acordo com o levantamento, em 2018, a taxa de homicídio de mulheres negras foi quase o dobro da de mulheres não negras. Outro fato que aponta a intersecção entre  machismo e racismo é de que o homicídio de mulheres não negras caiu 11,7% no período, a taxa entre as mulheres negras aumentou 12,4%.

A pandemia e o isolamento social não impediram os números de mortes desta parcela da população fossem elevados, com policiais fazendo operações nas favelas e mulheres sendo mortas dentro de casa.

Jovens negros são as maiores vítimas

Em 2019, 79% das vítimas de assassinatos cometidos por policiais eram negras, destas, 74% eram jovens com menos de 29 anos; três de cada quatro pessoas mortas tinham essa faixa etária. Dados que apontam a face mais perversa do capitalismo atrelado ao racismo.

Se não são mortos pelas mãos da policia, a população negra acaba sendo a maior vítima do sistema carcerário. Segundo o Anuário, mais de 755 mil pessoas foram presas, e dessas 66,7% eram negras e 32,3% brancas. Dados que apontam a face mais perversa do capitalismo atrelado ao racismo.

Bolsonaro e suas políticas contra o direito das mulheres

A política machista, racista, homofóbica e elitista travada pelo governo Bolsonaro e seus aliados apenas reforça a situação de violência no país. Esta é combinada à falta de investimentos em políticas públicas e do aumento do discurso permissivo e de naturalização da violência contra as mulheres.

As medidas e reformas defendidas pelo governo federal e pelos governos estaduais explicitam o descaso com as mulheres e, sobretudo, com os mais oprimidos.

Com a reforma da previdência, o governo rebaixou o direito das mulheres a se aposentarem e aumentou a idade para garantia do benefício. Como as mulheres são a maioria entre os beneficiários da previdência e mais da metade delas (52%) se aposentam por idade, na prática as mulheres terão que trabalhar cinco anos mais para conseguir se aposentar.

Já a reforma trabalhista elevou os acordos coletivos de trabalho acima das leis trabalhistas. Com isso, direitos como férias, 13º salário, FGTS, licença maternidade, auxilio creche, entre outros poderão acabar. As mulheres, que estão localizadas nos setores mais precarizados, onde os sindicatos têm menos força e por isso cedem mais facilmente à pressão dos patrões, serão as primeiras a ver seus já limitados diretos serem rifados nas mesas de negociação. Além disso, visa flexibilizar a jornada de trabalho, podendo aumentar de 8 para 12 horas diárias ou normatizar outras modalidades de contrato de trabalho como o contrato por produtividade e o contrato por hora trabalhada, o que impacta na remuneração e nos direitos adquiridos.

Já a anunciada reforma administrativa que ataca profundamente serviços públicos e o funcionalismo, composto em 55% de mulheres no funcionalismo federal, estadual e municipal, também tem um forte ataque às mulheres com a destruição de serviços essenciais, principalmente a saúde e a educação públicas.

Essas medidas são mais uma forma de violência contra as mulheres trabalhadoras, pois precarizam ainda mais suas condições de vida e as expõem a todo tipo de vulnerabilidade social. É preciso agir para barrar esses ataques.

É preciso dar um basta

A integrante do Setorial de Negras e Negros da Central Maristela Farias, que compõe também o Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe avalia que o crescimento do número de mortes de pessoas negras e mulheres no país reforça a necessidade de lutar contra esse cenário de genocídio da população negra. “Por isso, é necessário conscientizar a população da necessidade de nos organizarmos para lutar e combater essas formas de opressão e exploração que são impostas, seja pelos governos seja pelos patrões. Essa é também uma luta de classe contra classe”, reforça.

É necessário abordar cotidianamente sobre a situação de desigualdade que as mulheres enfrentam, por conta da cultura machista que ainda está enraizada na sociedade e que se intensifica com o sistema capitalista. “Enfrentar a violência contra a mulher é responsabilidade de todos e todas e ainda há muito a ser feito nesse sentido”, afirma a dirigente da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas Marcela Azevedo.

“Chamamos a classe trabalhadora à unidade para defender a vida das mulheres, lutar contra esse governo e contra esse sistema de exploração e opressão que é o capitalismo”, frisou Marcela.

A CSP-Conlutas lançou um programa emergencial no dia 17 de outubro, que tem como defesa a luta contra o racismo, o machismo e a LGTBfobia. “É preciso acabar com a discriminação, desigualdades e violência aos oprimidos da nossa classe. Lutamos pelo fim do machismo, do racismo, da LGBTfobia, contra a política de encarceramento em massa e genocídio do povo negro. Nossas vidas importam!”, defende o documento.

– Basta de violência machista e feminicídio negro!

– Fora Bolsonaro e Mourão. Damares não nos representa!

– Suspensão do pagamento da dívida pública e repasse de parte do valor para investimento em políticas de combate a violência contra as mulheres!

– Por centros de referencia no atendimento as vítimas e casas abrigo!

– Por emprego e renda digna para as mulheres romperem com a dependência financeira!

– Por uma sociedade sem machismo, sem racismo e sem violência, uma sociedade socialista!

Convocamos toda a classe trabalhadora a juntar-se a nós nessa luta!

A origem do dia 25 de novembro

O Dia Internacional de Luta Contra a Violência à Mulher, marcado em 25 de novembro de cada ano remete a uma homenagem as irmãs Mirabal (Pátria, Minerva e Maria Teresa), dominicanas que ficaram conhecidas como Las Mariposas por se oporem à ditadura de Rafael Leónidas Trujillo na República Dominicana, onde foram assassinadas em 25 de novembro de 1960.

O Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e Caribenho de 1981, realizado em Bogotá, Colômbia, aprovou a data para ser o dia Latino-Americano e Caribenho de luta contra a violência à mulher. A Assembleia Geral das Nações Unidas, realizada em 17 de dezembro de 1999, declarou que 25 de novembro seria o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, data também incorporada pela ONU (Organização da Nações Unidas).

Via: CSP-Conlutas.